quarta-feira, 25 de março de 2009

Tostines

Meu olhar-percepção-pensamento
aguçados me deixam mais triste
ou minha tristeza aguça
meu olhar-percepção-pensamento?

Cata-Vento

Na contramão dos caminhos,
gasto toda minha energia
pra alimentar meu rodamoinho,
e ver esta energia voltar a ser vento.
Ainda encontrei Sancho Pança,
desculpei-me por abandonar o sonho,
mas cansei de lutar com dragões.
Dulcinéia desceu da torre e ninguém
foi buscá-la.
Logo ali na frente, sorri quando percebi
meu vento captado no cata-vento de uma
pequena mão.

As botas estão na ativa

Essa semana encontrei as botas, e agora sei, elas continuam na ativa.
A temperatura anda quente lá fora, mas as botas brigam para não
ficarem na sapateira.
Reparei bem nelas, pra perceber o quão desgastadas estão,
afinal, daqui a pouco, já faz um ano que as acompanho pelas ruas.
E sim, reparei no couro mais macio, levemente desgastado, uns riscos brancos.
Elas envelheceram nesses tempos, mas continuam dispostas.
Acordam cedo para proteger uns pés que vivem num
prédio aqui perto, pegam ônibus e estudam na faculdade de arquitetura.
Dessa vez, acompanhavam uma saia preta e uma blusa qualquer.
Por onde anda o fiel companheiro, o vestido xadrez?
Estará furado, remendado? Será que foi doado?
Ou somente conta os dias para sair do armário?
Esperemos.

terça-feira, 3 de março de 2009

Parte 3 - O Carnaval

Sai de Salvador com seu famoso carnaval, para ir à sampa trabalhar de jurada no desfile das escolas de samba.

O carnaval de São Paulo tem suas origens a partir do Samba de Bumbo, que vem lá das senzalas.
E foi se transformando e se assemelhando mais ao carnaval do Rio, para ter mais apoio financeiro da prefeitura e mais visibilidade no carnaval do Brasil.

Mas ainda guarda peculiaridades na organização, normas e nos tipos de samba.
E é um carnaval corajoso, a verba é em geral 10 vezes menos do que a do carnaval do Rio (5 milhões),e é lindo, as fantasias e alegorias melhoram ano após ano.

E pra gente que trabalha é um trampo maravilhoso, mas complicado.
Sabemos da competitividade das escolas e isso traz uma marcação ferrenha em cima do nosso trabalho.
Os presidentes das Escolas de Samba mal sabem o quanto que muitos de nós, jurados, sofremos para penalizar as escolas. E falo isso por mim e por comentários de vários colegas.
Quantas vezes na noite ficava torcendo para elas não cometerem erros, para elas brilharem.
E quando uma escola passa perfeita, como foi a Mocidade esse ano - a campeã do desfile, é de arrepiar, é emocionante. Vibramos também.
Se eu pudesse gritaria para todos os presidentes: -Não é bom tirar nota, não tenho nenhum prazer sádico com isso, pelo contrário, faço isso triste e por justiça a escola que não errou.

Os presidentes querem um campeão (e cada um quer sua escola nessa posição, é claro), a competitividade existe e alguém precisa estar lá julgando para haver ganhadores. Parece óbvio, mas não sei se todo mundo percebe isso. E as regras, são eles próprios que estabelecem.

Vida de jurado não é mole não.
Já entramos na avenida vaiados, como se fossemos os inimigos do carnaval.
Sabe, jurado tem que ter duas mães, uma para ficar na da boca do povo e a nossa que mantemos guardadinhas em casa. Avisei a minha antes da apuração para estar preparada e disse que iam xingar a outra, que não era ela não...rs.
Meu tio logo depois que a torcida da Vai-Vai gritou para mim filha da puta, ligou pra minha mãe e disse: - viu como vc tá famosa, tá na boca do povo! Ainda bem que a família tem bom humor.

Adoro os sambas da Vai-Vai, o desfile da Gaviões, duas escolas que precisei tirar nota, e foram lindas. Amei a criatividade deles, o desfile todo. Mas ambas escolas cometerem pequenos deslizes que precisaram ser apontados, e é só isso que a nota reflete.

Não é bom ser a estraga prazer. Sabemos o quanto as escolas se preparam, investem tempo, sentimento,dinheiro, comunidades inteiras se dedicando de corpo e alma. Investem muito no desfile, que em geral são lindos mesmo!
Não sou filha da puta!!!! Apesar de no fim, até achar graça da manifestação, não é de sacanagem nunca, que tiramos nota.
E queria que todos soubessem que só avaliamos os critérios que foram desenvolvidos por eles prórpios. Ninguém quer fuder escola nenhuma.





























O desfile das campeãs foi marcado pela insatisfação com notas de alguns jurados.
Meio tragi-cômico.
Não pouparam esforços para demostrar o que sentem. Não sei se esse é o espaço, e se é a melhor forma de diálogo, tiraram a beleza e a leveza do carnaval, mas enfim, é a liberdade de expressão, a deles, na avenida e a minha, aqui nesse blog.

Parte 2 - Salve Yemanjá!


Fiquei emocionada. Foi a primeira vez que consegui passar a festa de Yemanjá aqui em Salvador. Com muita expectativa esperei esse dia 2 de fevereiro, pra homenagear minha mãe-Yemanjá, protetora dos mares e mãe de todos os orixás.
Segui orientação de amigos, que disseram que a homenagem melhor de ser feita é logo cedo, antes das 8 da manhã, quando o clima ainda está leve, antes dos foliões e da bebedeira que toma conta da festa.


Impressionante como as festas na Bahia acabam
ficando todas com a mesma cara do carnaval.

Assim, cedinho lá estava eu. A fila para mandar a rosa dentro da cesta no barquinho para alto mar é enorme, já nas primeiras horas da manhã e assim segue durante o dia todo. Preferi fazer a minha maneira, jogando minha rosa direto e prestando meu devotismo a essa figura tão simbólica de nossos mares. Me arrepiei toda, realmente é uma energia que não se explica.












Essa festa de Yemanjá tem aspectos interessantes, pois é a única festa de uma orixá que também é comemorada, como são festejados os santos católicos. Além de ser uma figura mitológica dos pescadores, Yemanjá está presente fortemente na Umbanda e Candoblé, mas é um orixá que caiu nas graças e simpatia de boa parte da população, independente da religião.


Nas areias, as tendas de candomblé para garantir os ritos e a estrutura necessária para oferendas e devoção, através dos altares, ervas etc. Logo que cheguei, um homem de uma das tendas perguntou se eu queria a benção de ervas, disse que sim, e ele fez a tal benção e depois queria 10 reais. Desculpei-me e não dei, odeio essas surpresas de valor no final. E aprendi - nada é de graça, nem a benção.
Mas fora isso, a festa deles é uma festa linda, simbólica, comandada pela energia dos atabaques.

Meio da manhã as ruas já estão tomadas por completa. O Comércio local vai de rosas, presentes para a rainha do mar e comidinhas e bebidinhas aos montes. Assim, como o passar do dia, mais bêbados se encontra pelo caminho e pior vai ficando a qualidade das músicas.

Mas para os de bom gosto, tem refúgios por perto para garantir o nível do som.

Como bióloga, sempre tive a preocupação com “os presentes” mandados para o mar. Presentes que incluem bonecas, pentes, espelhos, perfumes com frascos, sabonetes. Sabemos o quanto isso interfere no ecossistema aquático e que essa necessidade de materizalização é muito mais humana do que do orixá.

Esse ano teve uma iniciativa muito bacana e corajosa do Instituto Nzinga de Capoeira Angola que foi bem legal, deram uma triada nas oferendas para ir menos lixo para o mar. Com o slogan "Yemanjá protege a quem protege o mar” começa a mudança de hábitos culturais antigos e enraizados. A campanha tem que ser feita com cuidado, porque mexe na crença de um bocado de gente,
mas tem que ser feita, para que Yemanjá não morra no meio do lixo que vai pro mar.

Salve Yemanjá!!! Desta vez a frase vai no duplo sentido!